O texto a seguir retrata, sem retoques, o sentimento de um homem que nunca se curvou diante das adversidades. Um poeta que, mergulhado em si mesmo, há muitos anos fez uma crônica utópica sobre o dia da sua morte. Nas entrelinhas, sua narrativa propõe uma reflexão sobre a hipocrisia e a demagogia humana.
Quando eu morrer,…( Altino Rossi de Almeida)
Quando eu morrer, só quero ver
quem vem desfilar na frente do meu caixão,…
Parece que os vejo,…e como!!!
Muitos são cínicos, meus inimigos que, para descarregarem
suas sujas consciências,
abraçam meus familiares, dizendo, mentindo, é claro,
que sentem imensamente a minha partida, quando,
no íntimo de seus corações, dizem que já fui, muito tarde,
desta para, de preferência, para pior.
Outros, que nunca os vi, nem mais gordos, nem mais magros,
como queiram, que somente vieram para ver se serei enterrado
com a boca aberta ou fechada, ou se fiquei feio com o monte
de algodão dentro do meu nada pequeno nariz!!!
Aposto que estará assim de gente querendo cantar hinos
religiosos ou rezas, só querem aparecer.
Provavelmente alguns pastores ou alguns candidatos das
próximas eleições.
Que, com certeza, ao terminarem os blablablás, ficarão crentes
que estão abafando, Que tontos!!!
Alguns , como eu gostaria que viessem visitar-me em vida,…
Mas depois que eu morrer, de que me adianta???
Mas a coisa que eu mais detesto é que não vai faltar
quem diga que eu era tão bonzinho!!!
Por que só me atiraram pedras???
Ah!!!,…tem um alvoroço no portão de minha casa.
Vamos ver,…quem será???
Ora!!! Só podia ser eles mesmos!!! O prefeito com seus puxa-sacos!!!
Já tem até algum vereador querendo pôr meu nome
numa rua, ou coisa que valha!!!
Por que não me homenagearam em vida???
Quando eu morrer, não quero saber de caixão caro,
qualquer um serve, desde que não arrebente embaixo.
Deve ser um horror o defunto desabar no meio da rua!!!
Na minha lápide, basta o meu nome.
Se desejarem pôr datas de nascimento e morte, tudo bem.
Mais nada. Nada de velas, nada de fitas ou rabecões de flor.
Isso fica muito caro. Nada de discursos!!!
Mesmo porque, depois que os coveiros me porem bem lá
no fundo do buraco, onde os vermes estarão de boquinhas
bem abertas esperando-me, ansiosamente, diga-se de passagem,
o povo jogará terra sobre mim, com as duas mãos cheias,
para enterrar-me mais depressa, e todos voltarão alegres satisfeitos,
batendo o maior papo, certos de que cumpriram a sagrada missão de enterrarem
mais um político,…(Altino Rossi de Almeida *09/01/1944 – +05/05/2017.)